sexta-feira, 29 de maio de 2015

Ali Babá e os Quarenta Ladrões

Hoje eu quero compartilhar a história de Ali Babá e os quarenta ladrões, extraída do livro As Mil e uma Noites: Contos Árabes (tradução Ferreira Gullar - 5. ed. - Rio de Janeiro: Revan, set. 2010. pag. 141-156).

Ali Babá e os Quarenta Ladrões

     Nos confins do reino viviam dois irmãos, um dos quais se chamava Cassim e o outro, Ali Babá. Como o pai deles, ao morrer, deixou-lhes uns poucos bens que foram repartidos igualmente, parecia que a fortuna dos dois seria igual. Mas o acaso dispôs diferente.
     Cassim desposou uma mulher que,  pouco depois, tornou-se herdeira de lojas e terras e ficou rica, da noite para o dia. Ali Babá, ao contrário, casou-se com uma mulher tão pobre quanto ele, de modo que para ganhar seu sustento da família, tinha que ir cortar madeira no bosque e vendê-la na cidade. Os dois asnos que usava para carregar a madeira eram suas únicas propriedades.
     Estava Ali Babá na floresta, cortando madeira, quando ouviu um tropel que se aproximava. Tomado de súbito medo, subiu numa árvore grande e alta que havia ali perto e ficou observando os cavaleiros que se aproximavam. Ele os contou: eram quarenta e, por seus trajes e pelas armas que portavam, não teve dúvida de que se tratava de ladrões, o que logo se confirmou. Todos desmontaram dos cavalos, carregando pesados sacos que Ali Babá imaginou estarem cheios de moedas de ouro e prata. Um deles, que parecia o chefe, aproximou-se de uma rocha próximo à árvore em que trepara Ali Babá e disse estas palavras que ele ouviu claramente:
     - Abre-te, Sésamo!
     De imediato, uma porta se abriu na rocha e por ela entraram os quarenta homens com seus sacos de dinheiro. A porta se fechou em seguida. O primeiro impulso de Ali Babá foi descer rápido da árvore e afastar-se dali com seus dois asnos. Mas teve medo e preferiu manter-se no alto da árvore observando. Depois de algum tempo, os ladrões saíram da caverna e o chefe parou diante da porta aberta na rocha e disse: "Fecha-te, Sésamo!" A porta se fechou. Os homens montaram em seus cavalos e partiram.
     Ali Babá nãos desceu logo da árvore, temendo que os ladrões voltassem por ter esquecido alguma coisa. Quando os perdeu de vista e não mais ouviu i tropel de seus cavalos, desceu, afastou os ramos que cobria a rocha e repetiu as palavras que ouvira: "Abre-te Sésamo!", e a rocha logo se abriu. Quando entrou, espantou-se: em vez de um lugar escuro, deparou-se com um ambiente amplo, iluminado por uma abertura situada no alto da rocha. Ali havia grande quantidade de alimentos estocados, ricas mercadorias, pilhas de tecidos caros como sedas e brocados, tapetes de alto preço e sobretudo moedas de ouro e prata que enchiam urnas e sacos de couro.
     Diante de tanta riqueza, Ali Babá não se abalou. Tratou de levar consigo apenas moedas de ouro - especialmente as que estavam nos sacos de couro - na quantidade que pudesse transportar em seus dois asnos. Foi o que fez e, concluído o trabalho, parou em frente da entrada da rocha e disse: "Fecha-te Sésamo". A porta se fechou.
     Ao chegar em casa, Ali Babá fez entrar os animais com seu carregamento precioso, fechou a porta com cuidado e levou os sacos de ouro até o quarto onde sua mulher repousava. Esta, ao verificar as moedas que os sacos continham, supôs que o marido as havia roubado e se alarmou. Mas Ali Babá a tranquilizou, contando-lhe como conseguira aquela fortuna. Ela não só se acalmou como se entusiasmou ao se ver dona de tamanha fortuna, e quis contá-la, moeda a moeda. Mas Ali Babá a dissuadiu, alegando que, sem perda de tempo, deviam enterrá-las. A mulher concordou, mas quis guardar consigo uma pequena quantidade delas.
     - Enquanto cavas o buraco, vou à casa de teu irmão buscar uma vasilha para medi-las.
     - Está bem - disse Ali Babá, - desde que não contes a ninguém o nosso segredo.
     A mulher dirigiu-se à casa de Cassim, seu cunhado, e ali chegando, como ele estivesse ausente, pediu à cunhada uma vasilha emprestada para medir grãos. Sabendo que na casa de Ali Babá nunca havia grãos em quantidade, a cunhada tentou saber dela que grãos eram aqueles, mas nada obteve. A mulher de Ali Babá, ao chegar em casa, encheu a medida com moedas de ouro, despejou-as num saco menor e em seguida devolveu a vasilha à cunhada. Mal a mulher de Ali Babá saíra, a cunhada percebeu que no fundo da medida ficara presa uma moeda de ouro e foi tomada de surpresa e inveja.
     - Como Ali Babá agora tem ouro para medir? - perguntou a si mesma. - E onde esse miserável conseguiu tanto ouro?
     Quando Cassim, o marido, chegou, a mulher contou que a cunhada lhe pedira uma medida emprestada para medir grãos e na verdade foi para medir ouro. E mostrou-lhe a moeda que viera presa ao fundo da medida. Cassim, em vez de ficar contente com a sorte do irmão, que escapara da miséria tomou-se de inveja mortal. No dia seguinte, bem cedo foi à casa de Ali Babá e perguntou-lhe por que se fingia de pobre quando possuía ouro em quantidade. Ali Babá disse que não sabia do que o irmãos estava falando, mas este lhe mostrou a moeda de ouro que ficara presa no fundo da medida, e Ali Babá foi obrigado a lhe contar seu segredo. Como não lhe disse onde ficava a caverna, Cassim ameaçou denunciá-lo à justiça.
     - Será melhor para ti me dar a metade dessa riqueza do que perderes tudo.
     Ali Babá então lhe deu todas as indicações de como encontrar a rocha e como nela entrar. Assim, no dia seguinte muito cedo, Cassim tomou o caminho da floresta levando consigo dez mulas, pois estava disposto a se apoderar, não de uma parte do tesouro, mas de todo ele. Seguindo as indicações do irmão, encontrou a rocha, pronunciou as palavras mágicas e nela penetrou. A porta se fechou às suas costas e a riqueza que seus olhos viram ali superou de muito o que imaginara, o que lhe aguçou ainda mais a ambição. Passou então a arrastar para a saída da gruta muito mais sacos de moedas do que poderia transportar. Mas, na hora de sair, esqueceu a senha mágica que fazia abrir a porta. Em vez de "Abra-te, Sésamo", disse: "Abra-te, Cânhamo". Como a porta continuasse cerrada, passou a usar vários outros nomes sem nada conseguir. Assustado com a possibilidade de nunca mais sair dali, sua memória mais se embrulhava e confundia.
     Ao meio-dia, chegaram os ladrões. Ao verem as dez mulas próximas à entrada da rocha, desconfiaram de que alguém descobrira o seu secreto depósito. Alguns deles rodearam a gruta enquanto o chefe e os demais pronunciaram a senha mágica fazendo abrir-se a porta. Cassim, ao ver que a porta se abria, tentou escapar, mas foi agarrado e morto pelos ladrões. Estes, depois de recolocarem em seu devido lugar os sacos de moedas que Cassim pretendera levar consigo, perguntaram-se como ele havia entrado ali? Como descobrira a senha mágica? Isso era impossível, uma vez que somente eles a conheciam. De qualquer modo, pelo sim pelo não, decidiram cortar o cadáver de Cassim em quatro pedaços e deixá-los próximos à entrada da rocha, do lado de dentro, como uma advertência a quem, como ele, tentasse a mesma proeza.

Fonte: https://sites.psu.edu/tetirclblog/

     A mulher de Cassim, que esperava ansiosa por ele, tomou-se de preocupação ao ver que já anoitecia e ele não voltava. Foi então à casa de Ali Babá e manifestou-lhe sua preocupação. Ali Babá, inicialmente surpreso com a iniciativa do irmão, procurou tranquilizar a cunhada, dizendo que talvez Cassim tenha preferido voltar tarde da noite para que ninguém desconfiasse do tesouro que razia. Mas a noite passou, o dia amanheceu e nada de Cassim retornar. Foi então que Ali Babá dispôs-se a ir até a caverna procurá-lo, levando consigo as três mulas. Ali chegando, viu as marcas de sangue no chão e adivinhou o que teria acontecido. pronunciou a senha mágica, a porta se abriu e, ao entrar na gruta, deparou com o corpo esquartejado do irmão. Ficou chocado com o que viu. Em seguida, evolveu os pedaços do cadáver em panos e os pôs sobre um dos animais; os outros dois, carregou-os com sacos de moedas de ouro. Fez tudo isso o mais depressa que pôde, temendo a volta dos ladrões, e rumou para a cidade. Deixou duas das mulas em sua casa, e a outra, com o corpo do irmão, levou para a casa dele. Bateu à porta e quem abriu foi Morgiana, uma escrava correta, inteligente e muito imaginosa na solução dos mais difíceis problemas. Ali Babá, que sabia de suas qualidades, lhe disse:
     - Morgiana, vou te pedir para guardares um segredo inviolável: aqui está nestes embrulhos o corpo de teu senhor. Ele deve ser enterrado como tendo falecido de morte natural. Agora me leva à presença de tua senhora, pois devo falar com ela.
     Ao ouvir de ali Babá a notícia trágica do que ocorrera com o marido, a cunhada de Ali Babá começou a chorar desesperada. Ele então pediu que se acalmasse e guardasse segredo de tudo, para sua segurança e tranquilidade.
     - E para maior consolo teu - disse ele, - proponho que te cases comigo. Minha esposa não se oporá a isso e a minha fortuna se juntará à tua, tornando-te ainda mais rica.
     A cunhada pensou, enxugou os olhos e aceitou a proposta de Ali. Morgiana, por sua vez, tomou as providências para o enterro de Cassim. Foi a um boticário que havia ali perto e lhe pediu um remédio para seu senhor, dizendo que ele estava passando muito mal. Na manhã seguinte, voltou e disse ao boticário que o estado de seu dono piorara e que necessitava de um remédio capaz de trazer à vida um moribundo. Naquele mesmo dia, Ali Babá e sua cunhada anunciaram aos amigos e conhecidos que Cassim havia morrido, marcando o enterro para o dia seguinte. Enquanto isso, Morgiana procurou um sapateiro, muito velho, que era o primeiro a abrir sua loja cada manhã. Ofereceu-lhe uma moeda de ouro para fazer um trabalho especial, mas ele deveria ir até o local com os olhos vendados. Mustafá hesitou, mas Morgiana garantiu que não era nada que comprometesse sua dignidade ou sua honra e lhe prometeu outra moeda de ouro; ele concordou em segui-la. Morgiana só lhe tirou a venda quando chegaram ao quarto onde estavam as quatro partes do cadáver de Cassim, que o velho sapateiro remendão costurou de modo a deixá-lo inteiro. Terminado o trabalho, ela o levou até o ponto onde o vendara, tirou-lhe a venda e lhe entregou mais uma moeda de ouro para que guardasse segredo do que fizera. Logo depois, o corpo de Cassim foi enterrado. Sua sorte funesta tornou-se um segredo partilhado por Ali Babá e sua mulher, a viúva, Morgiana e o sapateiro Mustafá.

Fonte: http://www.myaudioschool.com/?cat=39

     Enquanto isso, os quarenta ladrões voltavam à gruta e não encontravam o corpo esquartejado de Cassim. ficou claro para eles que alguém mais sabia como entrar ali. E levara também alguns sacos de moedas de ouro. Era preciso urgentemente descobrir quem era esse ladrão. O chefe da quadrilha mostrou a seus comparsas a gravidade da situação e propôs que um deles se apresentasse como voluntário para ir à cidade investigar. Mas se lhe trouxesse informações falsas ou erradas pagaria com a vida. Apesar do risco, um deles se apresentou para realizar a tarefa e, no amanhecer do dia seguinte, chegava à cidade. A primeira loja que encontrou aberta foi a do sapateiro Mustafá que, no lusco-fusco da aurora, já costurava o solado de um sapato. O ladrão admirou-se de ver um ancião com vista ainda tão boa.
     - O senhor ainda não viu nada - vangloriou-se Mustafá. - Outro dia, com menos luz do que há agora, costurei um defunto.
     - Um defunto? - interessou-se o ladrão. - Talvez o senhor queira dizer que costurou a mortalha do defunto.
     - Pensa que eu estou caduco? Costurei um defunto que estava partido em quatro pedaços.
     O ladrão não teve dúvida. Era o homem que procurava. Pôs então uma moeda de ouro na mão de Mustafá e lhe pediu que o levasse ao lugar onde costurara o morto. Mustafá disse que não podia fazer isso uma vez que fora levado até lá com os olhos vendados. Mas o ladrão não desistiu: propôs que fossem até o lugar onde o vendaram e, partindo de lá, Mustafá talvez calculasse o ponto em que ficava a casa aonde o levaram. Mustafá não se mostrou entusiasmado, mas o ladrão ofereceu-lhe mais uma moeda de ouro, e ele concordou. De olhos vendados, Mustafá caminhou até determinado local e parou:
     - A casa deve ficar aqui em frente - garantiu.
     E acertou, pois estava parado diante da casa de Cassim, onde agora morava Ali Babá. O ladrão então marcou a casa com uma cruz branca na porta e voltou à floresta para comunicar a seus companheiros o bom resultado de sua investigação. Mas logo depois que o ladrão e Mustafá se afastaram, Morgiana saiu da casa e, notando a cruz branca pintada na porta, achou que seus senhores corriam perigo. Como as portas das três casas vizinhas eram do mesmo feitio que a da sua, conseguiu tinta branca e pintou uma cruz semelhante em cada uma delas. Mas nada contou a Ali Babá nem às suas esposas.
     O ladrão logo ao penetrar na floresta encontrou seus companheiros e lhes deu a boa nova: descobrira a casa do homem que procuravam. Todos ficaram muito contentes e o chefe logo ditou as providências a tomar: não tinham tempo a perder, rumariam imediatamente para a cidade e ali entrariam de modo a não despertar suspeitas. Disse como deveriam agir e partiram ao encalço de Ali Babá.
     Mas, quando chegaram em frente à casa assinalada antes, o ladrão que a marcara mostrou-se confuso, uma vez que agora, em vez de uma porta com a cruz branca, havia  quatro. O chefe da quadrilha ficou furioso e  mandou que todos voltassem para a floresta, uma vez que a viagem que fizeram até ali tinha sido inútil. O ladrão responsável pela informação equivocada foi considerado culpado e morto.
     Após um apelo do chefe, alertando para o fato de que tudo o que roubaram durante anos a fio corria perigo, outro voluntário se apresentou e, de imediato, partiu para a cidade. Lá encontrou-se com Mustafá, que repetiu as mesmas palavras e atos da vez anterior. De novo parou em frente à casa do falecido Cassim, dizendo ter sido ali que costurara o morto. Para evitar que ocorresse desta vez o que ocorrera antes, o ladrão preferiu fazer uma marca vermelha bem discreta na porta da casa. Feito isso, foi ao encontro da quadrilha.
     Sucede que, de novo, Morgiana notou o sinal e de novo repetiu nas casas vizinhas o que fizera antes. Desse modo, quando os ladrões chegaram ali em frente, outra vez se sentiram confundidos, e o responsável pela confusão também foi executado.
     Em face dos dois fracassos, o chefe da quadrilha decidiu ele mesmo assumir a responsabilidade de descobrir a casa do homem que lhes roubara tanto ouro. Chegando com Mustafá em frente à casa, em luga de pintar-lhe na porta algum sinal, preferiu restar bem atenção nela para não confundi-la com as outras três. Depois disso, rumou ao encontro da quadrilha que o esperava na gruta secreta. Chegando lá, expôs aos comparsas o plano que bolara: deveriam comprar nos povoados vizinhos dezenove mulas e trinta e oito vasilhas grandes de couro das que se usavam para transportar óleo. Com essas vasilhas poriam em prática seu plano.
     Foi assim que, compradas as vasilhas, mandou encher metade delas de óleo e, nas outras, escondeu seus homens com suas armas. Postas as vasilhas no dorso das mulas, serviu ele de condutor para levá-las até a casa de Ali Babá. Ali chegando, chamou pelo dono da casa e pediu-lhe que deixasse passar a noite no pátio de sua casa com sua tropa de mulas, carregadas de sacos cheios de óleo, que ele deveria vender ao mercado no dia seguinte.
     Embora o tivesse visto do alto da árvore, na floresta, quando o ouviu pronunciar a senha mágica que fez abrir-se a rocha, Ali Babá não o reconheceu em seu disfarce de mercador de óleo. Por isso o acolheu em sua casa.
     - Sejas bem-vindo - disse ao chefe dos ladrões, - podes entrar.
     E enquanto o homem descarregava os sacos que trazia no dorso de suas mulas, foi até a cozinha e disse a Morgiana que preparasse um jantar e arrumasse o quarto para um hóspede que acabara de chegar.
     Morgiana fez tudo o que seu senhor mandou. Depois de jantar, o chefe dos ladrões veio para o quarto alegando cansaço e deitou-se vestido como estava, à espera do momento certo para pôr seu plano em prática. Morgiana, quando foi preparar um banho quente para Ali Babá, percebeu que a lâmpada da cozinha esmorecia por falta de azeite. Dirigiu-se então ao pátio para tirar um pouco de azeite das vasilhas trazidas pelo hóspede. Ao aproximar-se da primeira delas, ouviu uma voz perguntar-lhe:
     - Já está na hora?
     Outra pessoa menos esperta que ela teria posto tudo a perder, mas Morgiana, sem se descontrolar, respondeu:
     - Ainda não. Mais tarde.
     Em seguida, foi de vaso em vaso, ouvindo a mesma pergunta e dando a mesma resposta até que, no último, encontrou apenas azeite. Voltou então à cozinha, apanhou uma panela grande, trouxe-a até o pátio e a encheu de azeite. Depois, levou-a de volta à cozinha e a pôs no fogo para esquentar. Quando o azeite estava fervendo, carregou-a até o pátio e foi despejando azeite fervendo em cada vaso, matando assim os trinta e oito ladrões que ali se escondiam. Feito isso, voltou para dentro da casa e ficou espiando pela fresta  de uma janela, até que apareceu o chefe dos ladrões. De acordo com o que combinara, começou a lançar pedrinhas nos vasos, mas seus comparsas não se moviam. Sem entender o que se passava, foi até um dos vasos para chamar pelo ocupante, mas logo sentiu um cheiro forte de fritura: o homem estava morto. Assustado, foi aos outros vasos e verificou a mesma coisa. Então, tomado de pânico afastou-se dali, trepou no muro do pátio e fugiu.

Fonte: http://bethdagostini.blogspot.com.br/2011/03/ali-baba-e-os-quarenta-ladroes-numa.html

     Ali Babá, quando acordou e encontrou ainda no pátio os vasos de óleo do hóspede, não entendeu nada e foi perguntar a Morgiana se ela sabia do mercador.
     - Ele é tão mercador quanto eu - respondeu ela. E contou-lhe o que tinha se passado durante a noite e como o tal mercador havia fugido pulando o muro do pátio.
     Ali Babá ficou muito agradecido a Morgiana e prometeu-lhe recompensá-la por sua lealdade e eficiência. Mas, naquele momento, era preciso desfazer-se daqueles corpos a fim de que ninguém soubesse o que se passara ali aquela noite. E assim, com a ajuda de Abdala, seu escravo de confiança, cavou uma cova funda e extensa no jardim da casa e nela depositou os corpos dos trinta e oito ladrões. Em seguida, ocultou cuidadosamente os potes de óleo e as armas dos defuntos. Quanto às trinta e oito mulas, as mandou que fossem vendidas, aos poucos, por seu escravo Abdala.
     Enquanto Ali Babá tomava essas providências para evitar que o povo soubesse de que modo se tornara rico, o chefe dos ladrões voltara a sua gruta na floresta a fim de ali curar-se da derrota sofrida e descobrir um modo de vingar-se de Ali Babá. Passo a noite imaginando e, ao acordar de manhã, tratou de pôr em prática seu novo plano. Foi até a cidade e alugou uma tenda, para onde levou aos poucos uma grande quantidade de tapetes e de finos tecidos que pôs ali à venda. Adotou  nome de Cogia Hussen e tratou de relacionar-se com os demais comerciantes da vizinhança, entre os quais estava o filho de Ali Babá, que agora trabalhava na loja que fora de Cassim. O interesse do chefe dos ladrões por se tornar amigo do jovem mercador cresceu quando o viu junto com Ali Babá, que fora à loja visitá-lo. Tratou de conquistar-lhe a amizade, dando-lhe presentes e convidando-o para comer.
 
Fonte: http://www.valdiraguilera.net/as-1001-noites-03.html

     O jovem, encantado com as gentilezas de Hussen, disse a Ali Babá que gostaria de lhe apresentar seu novo amigo. O pai então sugeriu que o convidasse para passear e ao final do passeio o trouxesse para cear em sua casa. Foi o que ele fez; mas, ao chegar à porta, Hussen hesitou em entrar, só o fazendo porque já um escravo a abrira e ele não encontrou desculpa para recusar o convite. Como estivesse com o rosto coberto, Ali Babá não o reconheceu quando o filho os apresentou. Ali Babá mostrou-lhe sua residência e finalmente convidou-o para cear. Hussen agradeceu a gentileza, mas lhe disse que não podia aceitar o convite, uma vez que não comia nem carne nem peixe nem legumes temperados com sal.
     - Não será por isso que me privareis do prazer de comer em vossa companhia - respondeu Ali Babá. - Ordenarei que se faça a comida sem nenhum sal.
     Em seguida, foi até a cozinha e disse a Morgiana como devia preparar a comida.
     - Que homem difícil é esse, que não come nada com sal?
     - É um homem muito simpático e amigo de meu filho, a quem devemos tratar com toda a cortesia - respondeu Ali Babá.
     Morgiana obedeceu, ainda que a contragosto. Mas foi até a sala de jantar espiá-lo e logo reconheceu nele o falso mercador de óleo, observando também que trazia um punhal escondido sob as vestes. "Não me admira - pensou ela - que esse celerado não queira comer sal em companhia de meu senhor. Ele é seu mais feroz inimigo e veio aqui para assassiná-lo. Mas, isso, não vou deixar que ele faça."
     Sem nada dizer, Morgiana preparou o jantar, que foi servido por Abdala. O falso Hussen, na verdade o chefe dos quarenta ladrões, enquanto comia tramava o modo como iria dar cabo de Ali Babá. Imaginava que, findo o jantar, Ali Babá e o filho estariam sonolentos do vinho que bebiam e os seus serviçais teriam ido dormir. Esse seria o momento propício para apunhalá-lo e fugir.
     Mas, para sua surpresa, antes que o jantar terminasse, Morgiana surgiu na sala vestida de odalisca, enquanto Abdala começou a tocar o pandeiro para que ela dançasse. Ali Babá alegrou-se com a iniciativa da escrava e chamou a atenção do visitante para a beleza da moça e suas virtudes de dançarina. Hussen viu que seu plano ia por água abaixo mas consolou-se dizendo a si mesmo que, tendo ganho a confiança de Ali Babá, não lhe faltaria oportunidade para matá-lo.
     Mal sabia que essa oportunidade jamais chegaria pois Morgiana sacou um punhal que trazia consigo e, com um golpe certeiro no coração, deu-lhe cabo da vida. Ali Babá e o filho ficaram horrorizados.
     - Desgraçada - gritou ele para Morgiana, - queres acabar com minha família?
     - Não - respondeu ela, - quero salvá-la.
     E, abrindo as vestes do falso Hussen, mostrou o punhal que ele trazia escondido nelas.
     - Olhai bem para as feições dele - disse ela a Ali Babá. - Trata-se do chefe dos ladrões que se disfarçou de mercador para vos matar, meu amado senhor!
     - É verdade! - exclamou Ali Babá. - Mais uma vez salvaste-me a vida. Para demonstrar minha gratidão, faço-te minha nora, dando-te como esposo meu filho. E estou certo que ele se alegrará com isto.
     O filho, longe de mostrar-se descontente, declarou-se feliz de ter Morgiana como esposa.
     No dia seguinte, no maior segredo, o corpo do chefe dos ladrões foi sepultado na mesma cova em que jaziam seus comparsas. E na semana seguinte celebrava-se o casamento do filho de Ali Babá com Morgiana, comemorado com um vasto banquete, danças, festas e jogos.
     Ali babá não voltou logo à gruta dos ladrões, uma vez que eles eram quarenta e ele só sepultara trinta e oito; imaginava que os outros dois ainda estavam vivos. Mas, passado um ano, como nada ocorreu que o preocupasse, decidiu voltar lá. Postou-se em frente à rocha e disse a senha mágica: "Abre-te Sésamo!" A porta se abriu, ele entrou e lá estava intacta toda a riqueza que os ladrões acumularam por décadas e décadas. Encheu uma maeta de moedas de ouro e voltou com ela para casa.
     Depois de Ali Babá, se filho, a quem ele ensinara o segredo de como entrar na rocha, e os filhos de seu filho, todos viveram, sem ostentação para não dar na vista, da riqueza acumulada pelos quarenta ladrões.

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