quinta-feira, 12 de março de 2015

A Primeira Viagem de Simbad, o Marujo

Hoje eu quero compartilhar a história da Primeira Viagem de Simbad, o Marujo, extraída do livro As Mil e uma Noites: Contos Árabes (tradução Ferreira Gullar - 5. ed. - Rio de Janeiro: Revan, set. 2010. pag. 61-65).

A Primeira Viagem de Simbad, o Marujo

     A considerável fortuna que herdei de meus parentes, esbanjei-a na juventude, em luxo e prazeres, sem levar em conta como tudo isso passa e que nada é pior que estar pobre e desamparado quando chega a velhice. Mas um dia felizmente tomei juízo e, disposto a mudar de vida, juntei o dinheiro que ainda me restava e deixei Balsora com alguns mercadores num navio que fretamos as nossas custas.
     Fizemo-nos ao mar e, a caminho das Índias Orientais, atravessamos o Golfo Pérsico. Fora do golfo nos defrontamos com o grande mar das Índias, quando o balanço do navio me provocou enjoos. Me senti muito mal, mas logo depois acostumei-me e a viagem seguiu sem maiores incômodos.
     Aportamos em diversos países, comprando e vendendo mercadorias, até que certa manhã divisamos uma ilha quase à flor da água que parecia um prado de tão verde. Recolhemos as velas e ancoramos, tendo sido permitido a quem o quisesse desembarcar na ilha. Fui um dos que desembarcaram e, quando estávamos ali a comer e beber, livres do balanço do barco, a ilha começo a tremer de modo assustador.
     O pessoal que estava no barco percebeu que a ilha tremia e gritou para que reembarcássemos imediatamente, uma vez que o que se pensava ser uma ilha era de fato uma baleia. Os mais rápidos logo chegaram ao navio, outros a ele se dirigiram mais lentamente, enquanto eu ainda estava sobre a ilha ou, melhor, sobre a baleia, quando ela mergulhou no mar. Mal tive tempo de me agarrar a um pedaço de madeira que trouxemos do navio para acender fogo. Enquanto isso, o capitão, pensando que já estavam todos a bordo, quis aproveitar o vento que começou a soprar e fez o barco afastar-se dali. Fiquei, assim, ao sabor das ondas, jogado de um lado para o outro e lutando para não me afogar, durante o resto do dia e toda a noite seguinte. Já não tinha mais forças nem esperanças de escapar da morte, quando uma vaga mais forte me jogou contra uma ilha, cuja orla era alta e escarpada, de modo que me foi muito difícil escalá-la. A muito custo, agarrando-me a raízes de árvores que por sorte havia ali, consegui subir e, afinal, extenuado, estendi-me no chão e deixei-me ficar, semimorto, até que a aurora despontou e se fez dia claro.

Fonte: http://www.valdiraguilera.net/as-1001-noites-05.html

     Embora estivesse mito cansado pelo tempo que passara no mar e porque desde o dia anterior não comera nada, mesmo assim saí em busca de alguma coisa para me alimentar. Encontrei algumas ervas e, por felicidade, uma fonte de água limpa, que muito me ajudou a recuperar as forças. Sentindo-me bem de novo, tratei de explorar a ilha, caminhando sem rumo certo. Cheguei a uma planície onde vi uma espécie de cavalo atado a uma estaca. Aproximei-me para observá-lo melhor, quando ouvi uma voz de homem que vinha de dentro da terra. Ele em seguida apareceu e me perguntou quem era eu. Contei-lhe minha aventura e ele, tomando-me pela mão, me fez entrar numa gruta onde havia outras pessoas que ficaram igualmente surpresas de me ver ali.
     Aceitei a comida que me ofereceram e então lhes perguntei o que faziam num lugar que me parecia tão deserto. Disseram-me que eram cavalariços do rei Mihrage, soberano da ilha, e que costumavam, nessa época do ano, levar para pastarem ali os cavalos do seu senhor.
     No dia seguinte tomaram o caminho de volta à capital da ilha, levando os cavalos, e eu os acompanhei. Ao chegarmos, fui apresentado ao rei Mihrage que, depois de perguntar-me quem era e o que fazia em seu reino, tomou-se de simpatia por mim e ordenou que me servissem de tudo o que desejasse. Como era mercador, procurei conhecer as pessoas de minha profissão. Busquei sobretudo os que eram estrangeiros para que me dessem notícias de Bagdá e talvez encontrar algum com quem pudesse voltar para lá. Frequentei também sábios da Índia, aos quais ouvi com prazer, o que não me impediu de ir render homenagens ao rei e de conversar com os nobres da corte. Muito aprendi com todos eles.
     Um dia entrou no porto um navio e começou a descarregar mercadorias em cujas embalagens reconheci minha própria marca e, convencido de que aquele barco era o meu, perguntei ao capitão a quem pertenciam aquelas mercadorias.
     - Tínhamos a bordo um mercador chamado Simbad que desembarcou com outros homens numaa ilha que na verdade era uma baleia boiando à superfícies da água - respondeu. - A baleia de repente mergulhou. Todos se salvaram, menos Simbad, cujas mercadorias trouxe aqui para vendê-las e entregar o dinheiro a sua família.
     - Capitão - disse a ele, - eu sou Simbad, que julgais estar morto. Podeis entregar-me essas mercadorias, pois elas me pertencem.
     Contei ao capitão como milagrosamente consegui salvar-me, mas ele não acreditou, julgando-me um impostor que se fazia passar por Simbad a fim de apropriar-se das mercadorias. Mas logo desembarcaram os tripulantes do barco e me reconheceram. O capitão, constrangido, me pediu desculpas e deu graças a Deus por me ter preservado da morte. Louvei sua honestidade e pedi-lhe que aceitasse, em retribuição, algumas mercadorias, o que ele recusou.
     Escolhi entre minhas mercadorias as mais preciosas e as levei de presente ao rei Mihrage, que me perguntou onde conseguira objetos tão raros. Contei-lhe de que modo inesperado recuperara minhas mercadorias. O rei aceitou meus presentes e por sua vez me presenteou com coisas ainda mais valiosas, Despedi-me dele e, antes de me fazer ao mar, troquei minhas mercadorias por outras da ilha, levando assim, comigo, madeira de aloés, sândalo, cânfora, noz-moscada, cravo-da-índia, pólvora e gengibre. Passamos por várias ilhas antes de desembarcarmos em Balsora, onde cheguei com lucros de cem mil cequins. Eu e minha família nos reencontramos entre lágrimas emocionadas e felizes. Comprei escravos de um sexo e de outro, adquiri ótimas terras e mandei construir uma grande e bela casa. Foi assim que tratei de esquecer os sofrimentos passados para enfim gozar os prazeres da vida.
     Simbad, tendo acabado sua narrativa, ordenou aos músicos que voltassem a tocar, já que haviam parado enquanto ele contava sua história. Continuaram todos a comer e beber e, quando a festa acabou, Simbad deu ao carregador uma bolsa com cem cequins:
     - Tomais isto, Hindbad, ide para casa e voltai amanhã para ouvirdes a continuação de minhas aventuras.
     O carregador se retirou, ainda confuso, mas contente com o presente que recebera. Em casa contou o que se passara à mulher e aos filhos, que deram graças aos céus pela existência de Simbad.

4 comentários:

  1. isso aqui é so a primeira viagem de Simbad o Marujo de sete viagens que ele fez é isso???

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    1. exatamente... mas aqui no blog você encontra as sete viagens na íntegra...

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